A presidente Dilma Rousseff sofreu nesta sexta-feira (6) uma importante derrota na sua batalha contra o impeachment. Conforme esperado, o relator da comissão especial que analisa a questão, deputado Jovair Arantes (PTB-GO), recomendou a seus colegas votar pela abertura de um processo contra ela.


Ao ler seu relatório por cerca de quatro horas, o parlamentar disse, com voz rouca, que "está convicto" que há "indícios de gravíssimos e sistemáticos atentados à Constituição Federal", o que configuraria crime de responsabilidade.


Nesta fase do trâmite do impeachment, cabe à Câmara dos Deputados apenas analisar se há elementos suficientes para que Dilma seja processada pelo Senado, não julgar se houve de fato crime.


A análise de Arantes - deputado próximo ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha - se concentrou, principalmente, nas acusações de irregularidades na gestão das contas públicas e em seus efeitos na crise econômica.

"O mais importante é que a gestão temerária das finanças públicas gerou uma crise de solução dolorosa, sem precedentes no país. A denunciada [Dilma] não pode se eximir de sua responsabilidade, como condutora maior da política econômica e fiscal do País", escreveu no relatório.

"A profunda crise brasileira não é só econômica e financeira, mas também política, e, principalmente, moral. O governo perdeu sua credibilidade aos olhos de nossa sociedade e perante a comunidade internacional. […] Tais atos justificam a abertura do excepcional mecanismo do impeachment", defendeu ainda.

O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini, divulgou nota afirmando que o relatório de Arantes deixa claro que "não há crime de responsabilidade para justificar o impeachment" da presidente Dilma Rousseff. Disse também confiar "que a maioria dos deputados fará Justiça".

O relatório só será votado na comissão — formada por 65 deputados — na próxima segunda-feira. Seja qual for o resultado, ele deve ser submetido a análise do plenário da Casa, formado por 513 deputados, nos dias seguintes. A expectativa é que a votação final ocorra no domingo, dia 17.

São necessários 342 votos para que o processo de impeachment seja autorizado pela Câmara. Se a maioria do Senado confirmar essa decisão, Dilma fica automaticamente afastada e o vice-presidente Michel Temer assume, enquanto é realizado o julgamento da presidente.

Entenda abaixo os principais argumentos do relatório de Arantes para justificar a abertura de um processo. Vale destacar que ele não levou em conta em seu voto as revelações da Operação Lava Jato sobre o esquema de corrupção na Petrobras, mas ressaltou que, caso o processo seja de fato aberto, isso poderá entrar na análise do Senado.

"Dilma atentou contra o princípio da separação dos Poderes"

A Constituição brasileira prevê que o Estado Brasileiro é formado por três poderes "independentes e harmônicos entre si": o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Dessa forma, cada Poder exerce limites sobre os outros, evitando abusos.

Na visão de Arantes, a presidente desrespeitou esse princípio quando assinou decretos de suplementação orçamentária sem prévia autorização do Congresso.

Ele destacou que o Legislativo tem papel central na elaboração dos gastos públicos, na medida em que aprova o orçamento que deve ser executado pelo governo.

Seu relatório aponta que o artigo quarto da LOA (Lei Orçamentária Anual) prevê que o aval do Legislativo para esses decretos é obrigatório quando a meta de superávit primário — economia para pagar juros da dívida pública — não esta sendo cumprida.

A análise de Arantes, a partir da denúncia apresentada pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Junior e Janaína Conceição Paschoal e da defesa de Dilma, concluiu que houve quatro decretos de 2015 em que isso não foi respeitado.

Arantes observa que isso ocorreu "pelo fato de o Executivo ter abandonado a meta fiscal então vigente" em julho de 2015, quando enviou ao Congresso um projeto de lei reduzindo o valor previsto para o superávit naquele ano de R$ 55,2 bilhões para R$ 5,8 bilhões. O problema, diz ele, é que o governo não esperou o Congresso aprovar essa lei, mas imediatamente já passou a autorizar as despesas como se a nova meta estivesse automaticamente em vigor.

Dessa forma, argumenta o relator, não restou alternativa ao Poder Legislativo, a não ser aprovar a nova meta. No final de 2015, o Congresso acabou por autorizar o governo a registrar déficit nas contas públicas.

"Os fatos mostram sérios indícios de inconstitucionalidade, ilegalidade e irresponsabilidade fiscal, negando-se a vigência e eficácia do art. 4º da Lei Orçamentária, e, por consequência, atentando contra o Poder Legislativo, que se vê constrangido, diante do fato consumado e no intuito de evitar o colapso das contas públicas, a aprovar uma meta fiscal que passa a depender, em última instância, da vontade exclusiva da Presidente da República", disse em seu voto.

A defesa de Dilma argumentou que esses decretos não elevaram os gastos totais do governo, apenas remanejaram recursos entre despesas previamente autorizadas pelo Congresso.


"Pedaladas são empréstimos com bancos públicos"

As "pedaladas" são como ficaram conhecidos os atrasos nos repasses da União para bancos públicos pagarem benefícios como Bolsa Família e seguro-desemprego ou para cobrir taxas de juros subsidiadas dentro de programas públicos como o Minha Casa Minha Vida, o Plano Safra e empréstimos do BNDES a empresários.

Arantes considerou em seu voto que os sucessivos atrasos nesses repasses configuraram, na prática, operações de crédito (empréstimos) entre governo e os bancos públicos, o que é expressamente proibido pela LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal).

Governos anteriores também registraram atrasos, mas não em volume tão alto, destacou. Em 2015, por exemplo, o governo Dilma teve que pagar R$ 72,4 bilhões para regularizar a situação, o que levou a um rombo recorde no orçamento de mais de R$ 100 bilhões.

"A dinâmica dos fluxos financeiros, a sua reiteração e os exorbitantes valores a descoberto do Tesouro com o Banco do Brasil, nesse caso, evidenciam que a União, sob o comando da denunciada [Dilma], transformou em regra o que deveria ser absolutamente excepcional: durante meses a fio, usou recursos do próprio Banco do Brasil, e não do Tesouro, para bancar as ações de governo", afirmou.

Segundo Arantes, a repetição das pedaladas "afrontaria os princípios da transparência, do planejamento e do próprio equilíbrio fiscal, valores caros no nosso ordenamento jurídico, tanto no plano constitucional quanto no estatuto de responsabilidade fiscal instituído pela Lei Complementar nº 101, de 2000 (a LRF)".

A defesa de Dilma disse que o TCU só considerou as "pedaladas irregulares" no final de 2015 e que alterou sua conduta após isso. O governo argumenta também que as operações envolvendo bancos públicos para pagar programas do governo são "prestações de serviço", não "operações de crédito".

"Gestão fiscal irregular levou à crise econômica"

Ao defender a abertura de processo de impeachment, o relator argumenta que essas operações irregulares trouxeram consequências graves para a economia do país e a "estagnação" de programas públicos com "Pronatec, FIES, Ciência sem Fronteiras".

"O descumprimento, pelo governo federal, de normas técnicas e legais norteadoras da responsabilidade fiscal e o desvirtuamento de princípios no tocante à transparência e à fidedignidade dos relatórios e demonstrativos contábeis configuraram gestão temerária das finanças públicas e contribuíram para uma crise fiscal sem precedentes no País", destacou.

Em seu voto, ele lista índices que registram recessão econômica, crescimento do desemprego, alta da inflação e trajetória crescente da dívida pública. Destaca também a "confiança dos investidores e consumidores em queda, a perda do grau de investimento e a elevação da taxa de juros".

"Além disso, é notória a falência dos serviços públicos, com a degradação nas áreas de saúde, educação, segurança, dentre outros", acrescentou.

O governo argumenta que a crise econômica é causada também por fatores externos, como queda do preços internacional das commodities, o que derrubou a receita do país com exportações.

"Impeachment não é golpe"

O relatório de Arantes rebate o discurso de que impeachment seria golpe, citando declarações de ministros do STF como Carmén Lúcia e Dias Toffoli.

Ela também cita casos de deputados petistas ou aliados do governo que no passado apoiaram pedidos de impeachment contra o então presidente Fernando Henrique Cardoso.

“Quando um grupo político está no poder, diz que é golpe. Quando o mesmo grupo era oposição, tratava-se de um processo legítimo. É preciso coerência nesse momento!”, criticou.

"E também não é porque a denunciada (Dilma) foi eleita legitimamente, pelo voto popular, com mais de 54 milhões de eleitores, que estaria ela beneficiada por um salvo conduto para praticar quaisquer atos, ainda que nocivos ao país e, principalmente, contrários à lei e à Constituição", reforçou.

A defesa de Dilma argumenta que o impeachment da presidente seria "golpe de Estado" porque não há provas de que a presidente cometeu atos de extrema gravidade, intencionalmente.

Fonte: R7.com

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